
Durante muito tempo, eu achava que trauma era sinônimo de grandes tragédias. Acidentes, perdas súbitas, violências graves. Mas, aos poucos, entendi que trauma também pode ser silencioso, subjetivo e profundamente enraizado no corpo. Percebi que certos incômodos físicos e emocionais que carregava tinham origem em experiências que, na época, eu não consegui processar. Hoje, compreendo que o trauma não é só o que aconteceu, mas também o que ficou congelado dentro de mim.
Neste artigo, quero compartilhar o que aprendi sobre como os traumas afetam o corpo e o cérebro, e como é possível, com cuidado e consciência, iniciar um caminho de cura.
O que é um trauma?
Trauma é uma resposta emocional a uma experiência intensa, dolorosa ou ameaçadora. Não é o evento em si que define o trauma, mas como o nosso sistema nervoso reage a ele. Isso significa que duas pessoas podem viver a mesma situação e reagirem de formas totalmente diferentes.
Um trauma pode ser algo pontual, como um acidente de carro, ou algo prolongado, como crescer em um ambiente de negligência ou abuso emocional. O que importa é que, naquele momento, a mente e o corpo não conseguiram integrar a experiência. Ela ficou registrada de forma fragmentada, como uma ferida aberta dentro de nós.
O impacto do trauma no cérebro
O cérebro reage ao trauma ativando áreas relacionadas à sobrevivência, especialmente a amígdala (ligada ao medo), o hipotálamo e o tronco cerebral. Nessas situações, o cérebro entra em modo de alerta máximo, conhecido como “lutar, fugir ou congelar”.
A questão é que, em situações traumáticas, essa resposta pode se manter ativa mesmo quando o perigo já passou. O córtex pré-frontal, responsável pelo raciocínio lógico e pelo autocontrole, perde espaço para as áreas mais primitivas do cérebro. Isso nos deixa mais impulsivos, reativos e hipervigilantes.
No meu caso, percebi que certas reações desproporcionais — como ansiedade intensa diante de críticas — tinham raízes em momentos antigos onde me senti exposto e indefeso. Era como se meu cérebro estivesse revivendo aquele estado de ameaça, mesmo anos depois.
O trauma e a memória corporal
Um dos aspectos mais fascinantes (e assustadores) do trauma é que ele não fica só na mente. Ele se aloja no corpo. É por isso que o corpo pode “lembrar” de algo que a mente esqueceu. Uma dor muscular recorrente, um bloqueio de voz, uma rigidez no peito — tudo isso pode ser memória corporal de experiências não processadas.
Durante sessões de terapia corporal, percebi que certas posturas ou toques despertavam emoções que eu não conseguia explicar racionalmente. Era como se meu corpo falasse antes da minha consciência compreender. Aos poucos, entendi que a cura não passa apenas pela fala, mas também pelo movimento, pela respiração e pelo acolhimento físico.
Sinais físicos e emocionais de que o trauma está ativo
Nem sempre é fácil identificar que estamos sob efeito de um trauma não resolvido. Alguns sinais comuns incluem:
- Tensão muscular constante
- Insônia ou sono agitado
- Crises de ansiedade
- Sensação de estar sempre em alerta
- Evitação de lugares, pessoas ou situações
- Dificuldade de confiar em outros
- Sensações corporais inexplicáveis
Eu vivi muitos desses sintomas sem entender sua origem. Achava que era “coisa da minha cabeça”, até perceber que era, na verdade, o meu corpo pedindo ajuda.
Como iniciar um processo de cura
O caminho da recuperação de traumas não é linear. Exige paciência, tempo e, acima de tudo, acolhimento. Aqui estão algumas práticas que fizeram (e fazem) diferença na minha trajetória:
1. Terapia com abordagem corporal ou integrativa
Buscar apoio de profissionais que trabalham com trauma de forma segura, gentil e gradual foi essencial. Técnicas como EMDR, Somatic Experiencing e neurofeedback ajudam o sistema nervoso a liberar traumas congelados.
2. Reconexão com o corpo
Práticas como ioga, caminhada consciente, dança livre e meditação me ajudaram a habitar novamente meu corpo, com menos medo e mais presença.
3. Respiração profunda e consciente
A respiração é um portal de autorregulação. Aprender a respirar de forma profunda, principalmente em momentos de ativação emocional, me ajudou a trazer meu corpo de volta à segurança.
4. Construir vínculos seguros
Relações onde posso ser eu mesmo, sem julgamento, são parte fundamental da cura. A confiança se reconstrói pouco a pouco, na presença do outro.
5. Permitir-se sentir, aos poucos
Aprender a reconhecer minhas emoções, nomeá-las e validá-las foi (e continua sendo) um exercício diário. Não preciso mais fugir de mim mesmo.
Conclusão
Os traumas moldam nosso corpo, nossa forma de pensar e de se relacionar. Mas eles não precisam ser sentenças eternas. Com cuidado, escuta e apoio, é possível liberar o que ficou preso e abrir espaço para novas experiências de vida.
Se você sente que carrega algo que não consegue explicar, que o corpo reage antes de você entender, talvez haja uma história de dor que ainda não foi ouvida. E tudo bem. O primeiro passo é se permitir acolher essa parte de você com amor e coragem.
💬 E você, já percebeu como certas experiências do passado continuam vivas no seu corpo e na sua mente? Compartilhe comigo. Vamos falar sobre trauma com respeito, empatia e esperança.
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